No poema "Opiário", publicado no primeiro número da revista Portuguesa Orpheu, supostamente escrito em março de 1914,no "canal de Suez, a bordo", e dedicado ao "Senhor Mário de Sá-Carneiro", Álvaro de Campos descreve-se assim:
" Eu, que fui sempre um mau estudante, agora
Não faço mais que ver o navio ir
Pelo canal de Suez a conduzir
A minha vida, canfora na aurora
[...]
E fui criança como toda a gente.
Nasci numa província portuguesa
E tenho conhecido gente inglesa
Que diz que eu sei inglês perfeitamente.
[...]
Eu fingi que estudei engenharia.
Vivi na Escórssia.Visitei a Irlanda.
Meu coração é uma avozinha que anda
Pedindo esmolas ás portas da Alegria
[...]
Volto á Europa descontente, e em sortes
De vir a ser um poeta sonambólico.
Eu sou monárquico mas não católico
E gostava de ser as coisas fortes.
[...]
Pertenço a um gênero de portugueses
Que depois de estar a India descoberta
Ficaram sem trabalho. A morte é certa.
Tenho pensado nisto muitas vezes.
[...]
Caio no ópio por força. Lá querer
Que eu leve a limpo uma vida destas
Não se pode exigir. Almas honestas
Com horas para dormir e pra comer,
[...]
Um inútil. Mas é tão justo sê-lo!
Pudesse a gente despresar os outros
E, ainda que co´os cotovelos rôtos,
Ser herói, doido , amaldiçoado ou belo!
[...]
E afinal o que quero é fé, é calma,
E não ter estas sensações confusas.
Deus que acabe com isto! Abra as eclusas
E basta de comédias na minh ´alma!"
Poliana Nunes Brandão -R.a: B-9485C-0
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