segunda-feira, 19 de maio de 2014

No poema "Opiário", publicado no primeiro número da revista Portuguesa Orpheu, supostamente escrito em março de 1914,no "canal de Suez, a bordo", e dedicado ao "Senhor Mário de Sá-Carneiro", Álvaro de Campos descreve-se assim:

" Eu, que fui sempre um mau estudante, agora
   Não faço mais que ver o navio ir
   Pelo canal de Suez a conduzir
   A minha vida, canfora na aurora
   [...]
   E fui criança como toda a gente.
   Nasci numa província portuguesa
   E tenho conhecido gente inglesa
   Que diz que eu sei inglês perfeitamente.
   [...]
   Eu fingi que estudei engenharia.
   Vivi na Escórssia.Visitei a Irlanda.
   Meu coração é uma avozinha que anda
   Pedindo esmolas ás portas da Alegria
   [...]
   Volto á Europa descontente, e em sortes
   De vir a ser um poeta sonambólico.
   Eu sou monárquico mas não católico
   E gostava de ser as coisas fortes.
   [...]
   Pertenço a um gênero de portugueses
  Que depois de estar a India descoberta
  Ficaram sem trabalho. A morte é certa.
  Tenho pensado nisto muitas vezes.
  [...]
  Caio no ópio por força. Lá querer
  Que eu leve a limpo uma vida destas
  Não se pode exigir. Almas honestas
  Com horas para dormir e pra comer,
  [...]
  Um inútil. Mas é tão justo sê-lo!
  Pudesse a gente despresar  os outros
  E, ainda que co´os cotovelos rôtos,
  Ser herói, doido , amaldiçoado ou belo!
  [...]
  E afinal o que quero é fé, é calma,
  E não ter estas sensações confusas.
  Deus que acabe com isto! Abra as eclusas
  E basta de comédias na minh ´alma!"




 Poliana Nunes Brandão -R.a: B-9485C-0

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